Na 1ª República, a persistente instabilidade política e as inevitáveis consequências da 1ª Guerra Mundial contribuíram fortemente para a degradação das já débeis finanças públicas e aos constantes aumentos do custo de vida, traduzindo-se numa conjuntura de crise e rica em convulsões sociais tais como, entre outras, as greves ocorridas na função pública que afectaram os sectores dos transportes e comunicações (ferroviários e correios) que estavam intrinsecamente ligados e eram, como se sabe, indispensáveis ao serviço postal. Nos correios, o período mais critico ocorreu de 3 a 20 de Março de 1920, embora os serviços telégrafo-postais, contrariamente aos restantes funcionários do Estado, continuassem em greve mesmo depois da concessão de ajudas de custo. O governo de então lançou-lhes um ultimato ameaçando com a cominação, sob a forma de Decreto, de perda do posto de trabalho para todos aqueles que persistissem na greve. Temerosos, o conflito laboral perdeu força e, embora subsistissem alguns focos de resistência dispersos pelo país, a actividade foi sendo aos poucos retomada e restabelecida a normalidade nos finais do mês.
Assalto policial com a GNR ao Jardim Botânico, onde se concentravam os
grevistas dos Correios e Telégrafos. A foto capta o cerco na Rua da Escola
Politécnica, na fachada da escola e portão norte que dá acesso ao Jardim.
Durante o período caótico, para dificultar o trabalho a operários, voluntários, forças militares e militarizadas engajadas e organizados para minimizar o impacto da greve, os grevistas surripiaram alguns instrumentos de trabalho indispensáveis à normal actividade do serviço telégrafo-postal, no sentido de que as suas reivindicações surtissem no efeito desejado. Desses, o mais visível é o carimbo da marca do dia a obliterar ou a marcar os objectos postais em algumas estações. Em sua substituição foram utilizados carimbos de origem não postal, tais como os da Confederação Patronal (criados expressamente para esta greve), de telegrafia, da GNR, de unidades militares e de diversas entidades civis.
Como recurso, foram também utilizados carimbos postais, móveis e/ou fixos, como a "Daguin" utilizada em Braga e o primitivo carimbo mecânico de Lisboa.
Este carimbo surgiu, creio, em meados de 1876 com a função de marcar correspondência e também, mais tarde, a obliterar – 30 de Maio de 1876 é a data mais antiga que conheço e, a mais recente, sobre selos da emissão D.Carlos I (Diogo Neto).
O bilhete-postal simples supra, dactilografado e datado de 19 de Março de 1920, é admissível que tenha sido entregue nos correios nesse mesmo dia ou seguinte, na Central ou numa estação urbana de Lisboa. Confrontados com a falta de carimbos e/ou acumulação de objectos postais para obliterar, separar e expedir, recorreram ao velhinho e inactivo carimbo mecânico que, devido a desgaste ou avaria, apresenta o grupo datador invertido e com erro (25MAR18). É provável que tenha sido obliterado apenas no dia 25 tendo chegado dois dias depois à estação de destino, em Guimarães.
foto: Fotógrafo não identificado. Arquivo Fotográfico Municipal de Lisboa.
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