05 julho 2012

Carimbos de Barras, de Pontos... e de Traços



 
Talvez com inspiração na obliteração tipo então em uso em França (losanges petits chiffres) e no sentido de evitar as obliterações pesadas e esborratadas, por vezes ilegíveis, devido à excessiva quantidade e proximidade das barras, foi criado expressamente para os correios de Lisboa e Porto um novo modelo de marca obliteradora: o carimbo circular de pontos.

Estas marcas, de formato circular e com o indicativo do respectivo numérico caracterizam-se por linhas formadas por pontos. Durante o período de utilização (1858-1869) foram distribuídas pelos correios de Lisboa e Porto algumas dezenas de carimbos deste modelo, existindo notáveis estudos, bastante completos, alguns deles já publicados. Além dos carimbos de pontos das estações centrais do correio de Lisboa (1) e Porto (52) estão também referenciadas com este tipo de carimbo as direcções de correio de Alhandra (7) e de Santo Tirso (74). Não deixa de ser estranha a existência e referência  a este tipo de marca obliteradora nestas duas últimas direcções de correio ou, porventura, nas delegações a elas adstritas. Sobre elas tenho uma opinião que passo a desenvolver, não com a pretensão de colocar um ponto final no assunto mas sim com o propósito de promover o debate e a partilha de peças filatélicas ou de documentação postal que possam vir a contribuir para sabermos um pouco mais sobre tão curiosa quão controversa existência.



Carimbo circular de pontos n° 7, atribuído a Alhandra

Alhandra foi, durante a primeira reforma postal, uma direcção de correio da administração central de Lisboa, não tendo qualquer delegação sob a sua dependência. Estão referenciados três carimbos de barras: um de 20 barras (6:8:6) e dois de 11 barras (4:3:4).

carimbos de 11 barras com algarismos com 6 e 5mm de altura

Não tive ainda a oportunidade de observar, nem sequer em imagem, um exemplar obliterado com o carimbo de pontos. Não o encontrei nas melhores colecções, expostas ou em catálogos de leilões, e desconheço quem tivesse tido esse privilégio. A primeira referência que encontrei sobre este carimbo foi na edição de 1965 do catálogo Simões Ferreira. As sucessivas edições do catálogo Afinsa sempre lhe fizeram alusão, mas como este nasceu (foi publicado em Setembro de 1984 - edição de 1985) entroncado no catálogo Simões Ferreira…
Existirá um ou mais exemplares com esta marca ou estaremos porventura a cair no erro de aceitar acriticamente a existência desta marca? 
Uma batida singular poderá, quiçá, estar na origem de uma incorrecta identificação... e um erro, se repetido, enraíza e transforma-se numa verdade.  

Um exemplo:


Será o raro carimbo de pontos de Alhandra? 
Na realidade, basta inverter a imagem para constatarmos que estamos em presença de um vulgar carimbo de pontos de Lisboa. A serifa alongada do algarismo 1 poderá sugerir a haste ligeiramente inclinada do algarismo 7, podendo induzir a uma incorrecta identificação do numérico.


Carimbo circular de pontos n° 74, atribuído a Santo Tirso

Santo Tirso foi, durante a primeira reforma postal, uma direcção de correio da administração central do Porto, estando-lhe adstrita a delegação de correio de São Tomé de Negrelos. Estão referenciados apenas dois carimbos de 20 barras (6:8:6 e 6:9:5).


Um dado interessante a reter é o período de utilização destes dois carimbos: a marca de barras do tipo 6:8:6, obliterou os primeiros selos até à emissão de D. Pedro V - cabelos anelados, inclusive, e a do tipo 6:9:5 encontramo-la a obliterar os selos desta emissão e seguintes, até à sua substituição pelas marcas ovais de barras da segunda reforma postal.

Com o carimbo de pontos, tenho conhecimento da existência de uma quadra e de dois exemplares soltos.



A imagem do outro exemplar, a preto e branco, encontra-se na obra "100 Anos do Selo do Correio Português" onde o Dr. António Fragoso alvitra que este carimbo de pontos, pela sua raridade, possa ter sido utilizado na delegação de São Tomé de Negrelos. Não disponho de qualquer informação ou objecto postal que possa confirmar ou desmentir essa dedução mas, por outro lado, posso avançar com alguma segurança que este carimbo de pontos resulta da alteração feita ao carimbo de barras do tipo 6:8:6, i.e., o carimbo "oficial" foi limado de modo a abrir sulcos verticais que lhe seccionaram as barras.

 

É possível que esta modificação "particular" não tenha sido do agrado das administrações centrais do Porto ou de Lisboa sendo determinada a sua substituição, surgindo então o carimbo de barras do tipo 6:9:5.
Esta opinião (excêntrica, pensarão alguns...) não é de agora e não surgiu por acaso. Ela irrompeu e foi amadurecida aquando a descoberta de uma marca mui peculiar.
 

 CE 13, tipo IV
carimbo de traços n° 129 de Pinhel
reprodução da marca

Não tenho grandes dúvidas sobre a genuinidade e deformação da marca primitiva. A hipótese de batida sobre uma superfície canelada foi afastada - atente-se no alinhamento dos sulcos centrais que passam milimetricamente entre os algarismos, reforçando a ideia do seccionamento das barras por meio de uma lima ou serra.




Bibliografia:
-  PINTO, Fernando de Oliveira. Artigos publicados nos boletins n°s 418 e 419 do Clube Filatélico de Portugal


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